WTorre tenta se reerguer – pela 3ª vez em dez anos

O grupo WTorre deu início a um novo processo de reestruturação – o terceiro em um período de dez anos – para tentar se reerguer e atravessar a crise que se abateu sobre a construtora nos últimos dois anos.

A companhia, que teve seu nome citado no ano passado nas operações Lava Jato e Greenfield, renegocia com bancos dívidas de R$ 1,5 bilhão e trocou, há duas semanas, de comando.

Walter Torre Júnior, fundador e presidente do conselho de administração do grupo, voltou ao dia a dia e está repensando a estratégia da empresa, que deverá voltar às suas origens.

A mudança ocorre em um momento financeiro crítico. O acionista Paulo Remy, com 10% de participação, foi afastado do comando e colocado, por ora, no conselho.

Torre, que tem os 90% restantes, nega desentendimentos com o sócio. Mas, há um mês, contratou a consultoria de reestruturação Ivix para promover mudanças no seu negócio. Pedro Guizzo, sócio da consultoria, assumiu a presidência no lugar de Remy.

Torre, 62 anos, criou seu negócio praticamente do zero, no início dos anos 1980, garimpando terrenos inóspitos na Vila Maria, na zona leste de São Paulo, e na rodovia Castelo Branco, saída para o interior de São Paulo, erguendo armazéns logísticos.

Antes, aos 16 anos, fundou uma empresa de delivery e depois, quando entrou na faculdade, fretava ônibus para levar alunos para a Universidade Mogi da Cruzes.

No início da carreira, também construiu casas de luxo no Guarujá (SP). “Todos os projetos, mesmo os considerados mais loucos, eu coloquei em pé”, disse. E é este ponto que, segundo fontes, pode ter sido o início de parte dos problemas que hoje a WTorre enfrenta.

“Walter é um empreendedor. Cria projetos, tem faro para os negócios e sonha alto. Só que não faz as contas. Precisa de um contraponto para dar a dose de realidade do risco financeiro”, disse uma fonte próxima a ele.

Do auge à crise

O grupo cresceu e se diversificou, passando a erguer nos anos 1990 edifícios comerciais e shoppings, depois entrou em infraestrutura – foi dono do estaleiro Rio Grande (RS), vendido em 2010 para Engevix -, e tem um projeto portuário no Maranhão. Entrou em entretenimento: construiu o Allianz Parque, o estádio do Palmeiras, e o teatro Santander.

A diversificação deu projeção à construtora, mas rendeu dores de cabeça. Abatido pela recessão, que o obrigou a se desfazer de ativos – como sua fatia no JK Iguatemi – e imóveis comerciais (vendidos ao BTG), o grupo ainda tem seu nome envolvido nas operações da Lava Jato e Greenfield.

Em julho, a construtora foi acusada de receber R$ 18 milhões para deixar a licitação para a construção do laboratório da Petrobrás, que teria ficado com a OAS. A WTorre nega irregularidades e diz que está à disposição para esclarecimentos.

Na Greenfield, que investiga fraudes nos fundos de pensão, Walter Torre foi convocado para depoimento coercitivo na Polícia Federal.

O caso refere-se ao estaleiro Rio Grande. A empresa esclareceu, à época, que construiu o estaleiro em 2005 com recursos próprios, sem verba pública, e vendeu o negócio à Engevix.

Depois disso, a Engevix se associou-se ao fundo de pensão da Caixa (Funcef). A investigação está em curso.

Nos últimos meses, a construtora começou a renegociar suas dívidas. Deu ativos como garantia, em torno de R$ 1 bilhão, para os bancos privados, como Bradesco e Itaú. Só com o Banco do Brasil, que financiou a construção do Allianz Parque, renegocia cerca de R$ 500 milhões.

A receita do grupo com estádio vem da venda das cadeiras – 10 mil de um total de 43 mil -, aluguéis de camarotes, espaço para shows, eventos corporativos e alimentação, mas não é suficiente para cobrir os investimentos feitos, segundo fontes.

Procurados, os bancos não comentam. Torre ainda tentou rever o contrato com o Palmeiras, mas perdeu a arbitragem, na disputa que ficou conhecida como a “briga das cadeiras”.

O grupo renegocia pagamentos em atraso com fornecedores e está demitindo. Em 2016, tinha 514 trabalhadores diretos e deverá enxugar mais.

O faturamento encolheu. Em 2013, a receita da construtora, que responde por 60% a 70% do negócio, era de R$ 1,2 bilhão – caiu para R$ 818 milhões em 2014.

O grupo não divulga os dados de 2015 e 2016, mas as vendas caíram mais, disse Torre. Com a Lava Jato, perdeu importantes contratos – um de R$ 300 milhões. Mas, segue otimista: “Tenho novos projetos pela frente.”

Grupo quer atrair fundos para parcerias em projetos futuros

O empresário Walter Torre Júnior precisa enxugar ainda mais a estrutura do grupo para tentar atrair fundos de investimentos para projetos futuros, que vão se concentrar mais em galpões logísticos, edifícios comerciais e infraestrutura.

Torre não quer repetir o modelo adotado pelo grupo no passado recente, como foi o caso da joint venture com australiana Goodman, extinta no ano passado após quatro anos de parceria.

Não será nada fácil para a WTorre atrair parceiros, considerando as pesadas dívidas e as denúncias que recaíram sobre o grupo no ano passado, segundo fontes. Sem crédito e com a imagem arranhada, o trabalho recém-iniciado pela Ivix terá um longo desafio pela frente.

Com perfil centralizador, Walter Torre vai voltar ao dia a dia dos negócios. As relações com seu sócio, Paulo Remy, que chegou ao grupo há 12 anos pela consultoria Galeazzi para reestruturar a empresa, estremeceram nos últimos meses.

Ele tentou reestruturar o grupo ainda em 2007 para ir à Bolsa, mas não teve sucesso. Os executivos Marco Antonio Bologna, ex-TAM; e João Cox, ex-Claro, foram chamados para gerir os negócios, mas tiveram passagens relâmpago pelo grupo entre 2010 e 2013, respectivamente.

Sem sucessão. No fim do ano passado, havia especulações de que Torre iria colocar seu filho Paulo nos negócios, mas não foi adiante. “Meus filhos (ele também tem mais duas filhas) estão seguindo seus próprios projetos”, disse o empresário.

Se conseguir equalizar suas dívidas – conversas que ainda estão em discussão -, também deverá tocar um projeto no porto em Itaqui, no Maranhão, com um parceiro chinês, para escoamento de produtos.

O que se verá pela frente deverá ser um movimento de corte de custos, com mais demissões, venda de ativos. O grupo já se desfez de importantes negócios, como a venda de participações em shoppings – a do JK Iguatemi rendeu R$ 640 milhões em 2014 para o grupo Iguatemi, da família Jereissati.

Torre conta que está na disputa de um projeto de Parceria Público-Privada (PPP) de iluminação pública para a Prefeitura de São Paulo, orçado em R$ 7 bilhões, mas que está suspenso pela Justiça. “Gosto de projetos de mobilidade. Fiz o Parque do Povo e me orgulho de ter criado esse projeto (uma forma de compensação para o tráfego da região com a construção do complexo de torres do JK Iguatemi).”

No Allianz Parque, pretende criar um museu de cera com jogadores, como o Madame Tussaud, para atrair receita. Torcedor do Santos, Torre diz que não liga para futebol. “Meu avô era palmeirense roxo.”

Fontes de mercado afirmam que a situação do grupo não é muito diferente de outras grandes construtoras e incorporadoras que foram abatidas pela recessão. Alavancadas, correm contra o tempo para renegociar dívidas e ganhar fôlego para evitar recuperação judicial.

Fonte: Exame

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